A culpa é do Fidel (e do Pinochet)


Uma menina de dez anos, em seu primeiro dia de aula em um colégio novo, entra no pátio da escola, desajeitada e deslocada, fica caminhando lentamente em meio a multidão de crianças. Algumas meninas que não a conheciam a convidam para entrar em uma brincadeira de roda e saem todas de mãos dadas até sumirem da visão.


Guion novamente, aquele cinema que homem pode beijar homem na boca e não pode comer pipoca e além de tudo passa filme francês - descrição feita com muita procedência pelo amigo Cícero - aprontou mais uma: A Culpa é do Fidel.


Um bom filme - francês, é claro - feito pela filha do Costa-Gravas com uma atuação exemplar de uma garota, que eu não conhecia, chamada Nina Kervel-Bey, é uma ficção daquelas que beiram um documentário. De essência marxista, panfletário, até, mostra a politização e esquerdização de um casal que vivia em Paris na época de chumbo para a América do Sul, depois de uma visita ao Chile. Os dois envolvem-se com a eleição de Salvador Allende e a vida de classe média vira uma bagunça. Os detalhes são muitos, como a mulher (filha do Gerard Depardieu, em uma atuação deplorável ) que troca os ensaios para a Marie-Claire por um livro defendendo o aborto; a casa - com um belo jardim - trocada por um apartamento pequeno; a empregada cubana e anti-comunista trocada por refugiadas de outros países; as visitas constantes de eternos barbudos e cabeludos e por aí afora. Tudo isso, ocorre sob a visão crítica da menina, estudante em um colégio de freiras, praticante de natação e uma verdadeira dama. Uma burguesinha, na verdade. Estas mudanças, além do conflito do próprio pai, espanhol que fugiu de Franco deixando a irmã e a sobrinha pra trás lutando contra a ditadura do general, de família nobre - vista sob a perspectiva da criança é encantador e angraçado. Duas cenas que emocionam: a eleição e a morte de Salvador Allende. Mas, não vou contar o filme (?) e vou enveredar para outros caminhos.


Esquerda ou direita. Direita ou esquerda. Quem afinal, está certo? Há algum certo? Eu sempre imagino um círculo, onde pode-se ficar um pouco para um lado, um pouco para o outro ou no centro da linha. O que acontece normalmente, é que fica-se caminhando para a direção a que se tende, e se vai indo, indo e - susto - acabam se encontrando no lado de baixo do tal círculo, caso este processo seja feito pelas duas tendências. Qual a conclusão disso: se forem extremados, são iguais. Pois no filme acontece um pouco disso: os pais da menina não querem que ela leia o Mickey por ser coisa da direita, do império, querem que ela aprenda solidariedade em meio a bombas de gás atiradas pela polícia. Seus avós comentam que os comunistas são pobres que querem tomas suas casas, suas vinhas e até os brinquedos das crianças, que não sabem por que eles não gostam (dos burgueses) que dão para eles roupas usadas e até a comida que sobra. Assim é difícil, afinal, não falamos de esquerda ou direita, pelo menos não com dignidade. Nem a direita é assim tão ruim e burra nem a esquerda tão burra e ruim. Aqueles anos já foram tarde e penso - é isso aí mesmo, Tarso - que não devemos apagá-los de nossas vidas. Devemos aproveitá-los para aprender o que não mais fazer, para não torturarmos e nem sermos torturados. Pode-se ser de esquerda com dignidade e paixão, com ideais e pensamentos bons. E de direita também, afinal, só que deve ser um pouco mais difícil. Ironias a parte, a sociedade precisa dos dois lados e cada um deles do outro. Não existiria sociedade sem as diferenças. Mas isso vai longe, então, fica para a próxima.


A propósito, a cena descrita no primeiro parágrafo é uma mostra de solidariedade, busca incessante durante todo o filme, que acontece no somente no final.


Um comentário:

Anônimo disse...

Tenho que ver este filme, azar que seja no Guion, este cinema é ótimo e ajuda muito quem está de dieta. A ideologia muda o mundo. O caminho político a ser escolhido determina se dois milhões de mulheres e crianças morram no Iraque ou se vamos continuar de braços cruzados vendo 5 milhões de refugiados vivendo (morrendo) em barracas no fim do mundo ou na África que para os poderosos é sinônimo.

cicero