Cinema menor

Têm vezes que as coisas não dão certo. É incrível, mas mesmo com preparação, empenho e todas as condições favorecendo simplesmente não funciona. Um exemplo é alguém que vai fazer um concurso: o sujeito estuda por vários anos, sacrifica a vida social, faz cursinho, devora apostilas e mais apostilas e quando chega no dia, claro dá "um nervoso", mas mesmo assim segue firme com o propósito: ser aprovado. Chega cedo no local determinado, vai no banheiro, confere a identidade, o lápis preto nº 2, a caneta azul e mais os reservas: tudo certo. É só fazer a prova. Tiro dado, bugio deitado. Enfim o resultado de anos de empenho. O futuro garantido. O casamento sonhado se tornando real. A segurança. Abre a prova e a primeira questão nunca ouviu falar. É assim mesmo, pensa. A segunda pergunta e - ué? - também nunca leu a respeito. Tem algo errado. A terceira, fica entre duas opções e tem consciência que sempre marca a errada nestes casos. Pronto. Se foi a tranqüilidade e com ela toda a bagagem trazida até aqui. Não interessa se as outras 97 questões eram sabidas ou não. Ali terminou a prova e o sonho. Provavelmente ainda dará um tropeço quando entregar o cartão de respostas e cairá como um plasta no chão, espalhando aqueles lápis tão ineficientes e bem apontados.


Ou, depois de uma viagem cheia de histórias, cheia de vivências, de curiosidades, recheados de gente interessante e situações marcantes, um escritor chega em casa, sozinho, toma um bom café com roscas de polvilho, coloca uma música calma em um volume também calmo, senta em frente ao computador, fecha os olhos, dá um suspiro profundo como a imaginação e tlec, tlec, tlec. Por horas aquele barulhinho do teclado é constante. Nem respira. Ponto final e enter. "Ufa, aí está" . E, claro, começa a ler. Horrível: mau escrito, inverossímil, com personagens descaracterizados, diálogos pobres e desnecessários. Enfim, uma droga.


Pois The Mist (O Nevoeiro) é mais ou menos assim. Frank Darabont tinha tudo em mãos: uma boa história (o conto de Stephen King), algum ou outro bom ator, dinheiro e toda tecnologia que ele pode comprar. Resultado de tudo isso: um filme que lembra as produções classe B. Na verdade, o filme é tão ruim que não vale nem a pena um aprofundamento um pouco maior. É certo que a tentativa de pôr uma conotação religiosa aos acontecimentos e aos monstros quase deu certo. Talvez o erro tenha sido o fraco desempenho interpretativo da responsável pela façanha. E o final, que não é nenhuma surpresa, o espectador é preparado para ele - me perdoem o jargão - é surpreendente mesmo assim, por que se torce para que ele não aconteça. Mas não chega a salvar os outros 122 minutos. Vi gente saindo do cinema antes do final. É um filme que permite isso aos não cinéfilos. E a pipoca estava ruim.

4 comentários:

Cícero disse...

Que banho de água fria. Sou tão fão do Stephan King que botei este nome em um gato que eu tive.

Silvares disse...

Beto, não podia estar em maior desacordo! Gostei bastante do filme e achei o desempenho de Marcia Gay Harden muito bom. No Brasil dobram os filmes ou passam com subtítulos (em Portugal chamamos legendas)? A cena final deixou-me a pensar na vida...

Silvares disse...

Beto, não podia estar em maior desacordo! Gostei bastante do filme e achei o desempenho de Marcia Gay Harden muito bom. No Brasil dobram os filmes ou passam com subtítulos (em Portugal chamamos legendas)? A cena final deixou-me a pensar na vida...

Beto Canales disse...

Os filmes aqui são legendados. Em qualquer análise cinematográfica, se tirarmos os conceitos técnicos, o resto é simplesmente gosto. Mas, neste caso, que tinham tudo pra fazer uma obra pra entrar pra história e não fizeram, áh, isso é verdade. A cena final é forte e muito boa. E me deixou a pensar na morte.
:)