A pedido

Sabem aquela velha história de que o freguês sempre tem razão? Pois é. Será que tem mesmo? Se fizermos uma transmutação de freguês para leitor, talvez eu fale com mais propriedade.
No mesmo dia chegaram dois mails sobre um mesmo texto. Um deles, sabe-se lá qual a razão, elogiando de uma maneira bem entusiástica (inclusive com palavras bastante carinhosas - saliente-se, sem nenhum apelo sexual) meus escritos, digamos, quebrados, recortados, enfim, intercalados. O outro afirmando que prefere frases longas e quase sem interrupção alguma, o que facilitaria para uma leitura rápida e dinâmica além de auxiliar na compreensão. Ufa!
Conto isso para falar da questão crucial na vida de um escritor: para quem ele está escrevendo? Quando está lá, frente a tela iluminada de um computador, (acabou aquela poesia do sujeito de barbas longas, escrevendo com uma pena enorme, que molhava em um tinteiro prateado e cheio de curvas, sob a luz cambaleante de uma vela), ele está produzindo para quem? Aquela história de que cria para ele mesmo, para sanar uma necessidade interior, para satisfazer suas própria necessidades literárias é conversinha para boi dormir. Mas, então, para quem?
Se a pergunta fosse "para que" seria bem mais fácil, frente a tantas opções. Para ganhar dinheiro, notoriedade, concursos, enfim, tantas e tantas situações. Mas, referindo-se objetivamente para quem, a coisa fica mais difícil.
Uma outra questão é se devemos mudar a forma da escrita em razão do objeto final, ou seja, do gosto do leitor. Creio que não. Além de ser impossível, acredito que enfraqueceria o texto, tiraria o "toque" especial que cada autor tem, ou deveria ter.
Pensei bastante a respeito disso tudo e, depois de coçar a longa barba branca, de respirar o ar com cheiro de vela, e respingar no papel branco um círculo perfeito de tinta, concluí que escrevo sem a pretensão de agradar um ou outro. Talvez pela informalidade, talvez pelo veículo ou talvez porque eu seja mesmo despretencioso e descuidado, não pretendo satisfazer gregos e troianos. Na verdade, não escrevo para tornar-me agradável. Basta ver que alguns textos refletem os momentos de alegria e tristezas com fidelidade. Essa foi minha primeira conclusão. Não sei sequer se isso é bom ou ruim, sei que é verdade. Resumindo, escrevo aquilo que quero, e não aquilo que querem ler. 
Creio que isso pareça um tanto arrogante, mas, acreditem, não é. O fato de eu escrever isso tudo é, além de mostrar para os meus "fregueses" que não precisamos ter ou não razão para uma boa leitura, é para responder um terceiro mail que tratava, sobre, adivinhem?, religião!
Pois meu fiel catequizador, adversário na área político-religiosa-espiritual, e amigo virtual no resto todo, enviou-me um verdadeiro tratado do catolicismo e, ao final, perguntou se eu havia aderido, enfim, à fé, já que eu venho escrevendo sobre cinema, viagens e nunca mais opinei sobre religião.
Pois, pois. Tenho acompanhado de perto as andanças de Bento, o dezesseis, aquele com cara de mal, e em breve volto à cena, mas, o fato é que a razão de eu não me pronunciar sobre algo, não indica que tenha mudado de opinião.
Ao contrário. Se eu mudar, vou "cantar aos quatro cantos". E vivo mudando, sempre, constantemente.
Mas, neste caso específico, não.
Viram como escrever para um caso particular enfraquece o texto?
Saco isso.

3 comentários:

Onofre Dias disse...

Enfim, voltaste a escrever... que bom

Silvares disse...

Este texto deixou-me a pensar e cheguei a uma pequena conclusão: gosto de escrever para o meu caderno! Não gosto de escrever para o computador. Ao que parece, escrevo sempre para um objecto implicado no processo: caderno, computador, o leitor é um acidente.
;-)

Ricardo Valente disse...

Difícil explicar os porquês do escrever, mas pensa bem: é admirável poder escrever direcionado, visando metas, leitores, sucesso... Não é para qq um. É um dom a mais!