Imaginem bem no alto da colina o Mosteiro, forte e imponente. Ao redor, o pequeno vilarejo com casas frágeis e povo também, abaixo de chuva, muita chuva. As plantações perdidas, os animais mortos, pessoas desaparecidas, cabanas destruídas. Dentro do templo, um religioso olha para o abade e diz que rezará para que a chuva pare, enquanto os outros descem ao mundo para ajudar os nativos. E assim acontece. Os monges ficam na vila trabalhando, auxiliando, limpando e o outro no templo entregue às orações. Passam os dias e precipitam as noites sempre da mesma forma: chuva, trabalho e prece. Até que, quase um mês depois, a chuva pára e o monge que orava vira-se para o superior e diz: - Viu?

Imaginem, também, uma seca violenta. A tribo perdida em meio a imensidão do cerrado começava a passar fome. A água potável terminava junto com os rios que secavam. A pequena roça de mandioca já não mais produzia na terra árida. O pajé, com um olhar soturno, avisa ao cacique que, enfim, começaria a dança da chuva. Cogita-se até em mudar a tribo de lugar, mas a dança tem começo. Passam as noites e precipitam os dias sempre da mesma forma: seca, fome e dança. Até que, quase um mês depois, a chuva começa e o pajé que dançava vira-se para o cacique e diz: - Viu?

É com isso que lidamos? Somos (nós, a humanidade) inocentes. Crédulos. Nem falo em religiões, a meu ver nenhuma presta, e sim em esperança. Outro dia depois de um desastre que matou várias pessoas, inclusive uma criança, e destruiu tudo, uma velha desolada meio ao caos diz chorando para a câmara: graças a deus não morreu mais gente. Como assim? E os que tombaram sem chance de defesa, com dor, com mágoa? Que morreram mesmo antes de realmente viver? Não seria o mesmo deus que salvou a velha o responsável pela morte da criança? Às vezes penso que isso não é esperança, é egoísmo. Sempre agradece o vivo. Se eu fosse culpar alguém não seria algo celestial e sim o terremoto. E se fosse agradecer por não ter morrido, também não seria nada espiritual, e sim à sorte. Mas já que a parte boa - se é que pode-se fazer esta afirmação - foi atribuída a deus, que se faça isso também com a ruim, questão de justiça.
Tem uma história (das várias tétricas) na bíblia, que conta a ida de um sujeito a um lugar ermo para que matasse seu filho, como prova de sua dedicação, obediência ou qualquer coisa assim, a deus. Quando ia executar a criança, recebe um cordeiro para que fizesse a troca, pois sua dedicação fora reconhecida. Não sei bem a história e nem pretendo saber. O que me interessa é somente o começo: na verdade não basta crer em deus? Tem que provar também? Isso me parece coisa de adolescentes apaixonados. A velha do desastre salvou-se por ter provado a deus que acreditava nele? E não há uma certa insegurança divina nisso tudo?

Este prólogo todo é para dizer uma coisa somente: acreditamos! Somos a própria crença. Somos capazes de fazer chuva, de fazer com que pare de chover e, se não somos nós mesmos, estamos muito próximo da divindade. Basta sermos práticos: agradecer, função dos que permanecem vivos e calar, função dos que falecem. Somos muito bons nisso! Claro, também temos que provar. Viu?









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