Constatações de um novo homem

Sempre que começa um novo ano não faço promessas nem fantasio com resoluções mirabolantes. Eu simplesmente faço constatações. Deve ser a experiência chegando. Velhice (se bem que essa palavra me parece um pouco exagerada por natureza) não poderia mesmo resumir-se em o peso e barriga aumentando e cabelos e altura diminuindo. Os anos devem trazer, também, algo de bom.
Pois minha experiência - isso deve ser o algo de bom - mostrou-me neste início de ano que sou um homem independente. Sou, possivelmente, o representante masculino mais independente da história da nossa civilização. Chega a tal ponto que algumas leis de sobrevivência, costumeiramente anunciadas (e usadas entre os escoteiros, por exemplo), como o desenvolvimento de trabalho em equipe e suas vantagens, vão por água abaixo. Sou o oposto de comunidade, o contrário de conjunto, o antônimo de coletivo. Sou Beto, o independente! Desde que, claro, a olhos verdes esteja por perto. (A saber - para algum novo leitor - olhos verdes - ou simplesmente O.V. - é a minha feliz companheira de quase duas décadas. Possivelmente um longo tempo para mim e apenas um lapso temporal para ela, mas, infelizmente, minha faraônica modéstia não me permite comentar sobre assuntos íntimos). 
Enfim, falava sobre minha independência. É realmente assustadora. Ela passa dos limites do razoável e coloca o ser humano em um estágio acima, um degrau além. Exemplos? Meias. Sei exatamente onde elas ficam, naquela posição de bolinha, a minha espera. Cuecas. Perguntem se preciso de alguém para me dizer onde estão? Perguntem, vamos? Pois não preciso. E tem mais: pijamas, bermudas, calças. Não, calças não. Melhor nem colocar na lista  porque, às vezes, não consigo tirar apenas uma daquelas varetinhas e derrubo todas. Não sou muito bom também em camisetas dobradas, porque sempre quero a que está mais embaixo de todas, e aí, provavelmente por ciúmes, as que ficam empilhadas encima  se revoltam e elas mesmas se amassam.Um ato típico de auto-amassamento me tornando, portanto, inocente de qualquer acusação. Assim como não tenho culpa se a camiseta que eu quero seja sempre a mais de baixo, também não tenho culpa que as roupas se amarrotem.  Mais exemplos? Fácil. Poderia ficar listando por páginas e mais páginas, mas, vou dar apenas mais um que será definitivo, cabal, absoluto: máquina de lavar louça. Acreditem, senhores, temos em casa (Papai Noel trouxe, por indicação da amiga e leitora  - sim, elas existem - Sandra) uma dessas maravilhosas máquinas indispensáveis para pessoas modernas e independentes e eu, euzinho aqui, sei colocar as louças dentro, programar e ligar sem a ajuda de ninguém. Nin-guém! Dá pra acreditar? É verdade que às vezes esqueço que deve-se colocar um negócio chamado "líquido secante" (acreditem, é isso mesmo), mas, também, querer que eu lembre de colocar o "líquido secante" (sério, é assim mesmo) é demais.
Resumindo: sou mesmo o grande independente. Acho até que fui eu quem gritou "Independência ou morte" e, como não morri, cá estou, livre, leve e solto, e com o domínio quase total da máquina de lavar louças e do "líquido secante" (quer apostar que é assim?)
Pronto, meu ego está em regozijo com esse texto. 
Agora, é só esperar a olhos verdes dar uma olhada nele e publico. 

2 comentários:

Letícia Palmeira disse...

Sou o oposto de comunidade, o contrário de conjunto, o antônimo de coletivo.

Gostei.

E minha máquina de lavar depende de mim. Ela não faz nada sozinha. Preciso prestar atenção no tempo de lavagem, na quantidade de sabão líquido e ainda tenho que retirar as roupas. Eu odeio essas máquinas mentirosas. Eu quero um robô. :)

roberyk disse...

Grande Beto. Delicio-me com suas crônicas e atrevo-me em dizer que deveriam virar seriado na TV. Esse negócio de "líquido secante" eu nem sabia que existia porque comigo, louça é na base da esponja. E o vento que seque tudo...
Abração.