Decreptude

Estou encrencado. Coisa séria por demais, como dizem por aí.
Na literatura, sempre busco conflitos. Acredito que textos sem eles ficam vazios, inócuos. O contrário, em compensação, dá o que falar. Penso que para termos um bom romance, ou um bom conto, ele seja fundamental. É o tempero, o sal.
Na vida real - mesmo sem ser rei - quero distância. Prefiro a calmaria. Gosto de "levar" a vida sem me preocupar que ela me "leve" vez ou outra. Do silêncio e de não fazer silêncio algum. Gosto de ser gostado e de gostar das pessoas. Frase feia e cacofônica mas verdadeira. Falando nisso, gosto de verdades e de mentiras que não dão certo. De sentir o desafio de uma noite fria, desde que aquecido. Do vinho aguçando meu paladar. Da luz quando vencida pelo escuro, e do breu quando invadido pelo claro. Lusco-fusco. Gosto do olhar verde de meu menino e de amar um homem sem ser homossexual. De ser pai e não de ser filho. De não ter pressa e estar sempre correndo. Gosto de não correr de tênis e calção. Gosto de chorar no cinema e de rir em qualquer lugar. Não gosto de um poema que não entendo e compreendo que não é para mim. Gosto de saber e sei do que gosto e do que não gosto. E digo "encrenca".
Pois estou encrencado. Fico nesse devaneio para não ir direto ao assunto: conflito. Homérico, faraônico, incomensurável conflito. A coisa é tão feia que nem deveria estar aqui escrevendo. Por sinal, os deslocados termos não são ao acaso. Nem as rimas inseridas e as palavras repetidas. Tudo consequência. Em vez de estar sentado aqui redigindo, deveria, isto sim, estar frente a um psicólogo, preferencialmente psicanalista com cavanhaque branco, de Buenos Aires, dos bem ortodoxos. Ou, sei lá, em uma delegacia. Melhor ainda, em um conselho tutelar. Mas, já que teimosamente estou aqui, vamos lá.
Aconteceu uma briga horrível. Não quero dar razão aos que me chamam de exagerado, mas todos os adjetivos que usei acima para mensurar o conflito ficam pequenos, humildes. E o pior de tudo não é o tamanho e sim os participantes. Tenho até vergonha, mas confessarei para servir de exemplo a todos. Se somente uma pessoa conseguir evitar o que estou passando, terá valido a pena eu enfrentar toda minha angústia. Provavelmente depois da revelação, o cavanhaque branco será indispensável. Meu vinho, meus gostos, minha calma, meus sons, minha luz, enfim, minha vida, será somente uma partida de xadrez, estrategicamente calculada em busca do final. A revelação será somente o estopim, a bomba vem depois.
Sentem-se, senhoras e senhores.
Acomodados? Não?
Eu espero!
Ok. Vamos lá. Minha criança interior brigou com meu amiguinho imaginário. Isso mesmo. Não sei como agir. E isto é somente o estopim. O pior, a bomba, vem agora: eles foram embora. Estou só. Gritei, clamei, collori "não me deixem só" mas de nada adiantou. Em um segundo tornei-me velho, sozinho e caduco.
Querem ver? Pois quando citei coisas de que gosto, pasmem, esqueci da Maitê. Não algo simples como esquecer de respirar ou desimportante como quem eu sou, mas da Ma-i-tê!
Se ela não me perdoar e o Parkinson permitir, meu próximo texto será sobre suicídio.
E vou comprar um Play Station. Sei lá. A gurizada pode voltar!



11 comentários:

Leandro Noronha da Fonseca disse...

tenho emdo da velhice, medo mesmo.

hasta!

Biba disse...

Tento pensar, desesperadamente, que a velhice pode, tem que ser agradável. Devo ser um bruta sonhadora, mas queria algo assim...
Não esqueça mais a Maitê, enh!

Beijos
Carpe Diem!!

Ricardo Valente disse...

Que decrépito! Se comprar um Wii é capaz deles voltarem e ela visitar para uma sessão de Fit. Quem sabe depois um vinhozinho?...
Abraço!

Beto Canales disse...

E eu que pensei primeiro em um Atari...

Letícia disse...

Observações:

Essa do psicanalista de cavanhaque foi muito boa. Porque eles têm cavanhaques e não entendo o motivo.

Você sempre fala de política - nem que seja de passagem - lá bem escondido.

E você foi lírico. Do começo ao fim. Digo que foi até lúdico e trouxe uma ironia mais suave do que de costume. Eu li o texto achando que você iria soltar os cachorros em alguém, mas foi o contrário. Você falou de si como se fosse quase poesia. E falou em conflitos. Eu concordo em parte - porque exagerar em qualquer dose - seja na literatura ou na vida, é um erro. E eu gostei muito. E a Maitê deve ter amado. =)

Brincadeiras a parte... Desculpa a maionese. É que, de vez em quando, eu leio com mais atenção.

Bjos, Sr. Editor.

PS.: E eu jogava atari. ¬¬

gloria disse...

Beto, eu gosto dessa tua forma deixar um "legal" despojado no meu blog. Acho que teu menino passeia e carrega, um sorriso, maroto entre os lábios. Ele não precisa de muitos signos do mundo "adulto" para dizer. Apenas isso, dizer. Eu deslizei nesses escritos. Ah! se eu fosse a Maitê! bejim.

Ivansalvador disse...

parece que voce gosta mesmo de viver e passando por esse conflito com o seu "eu" ta dificil a coisa ne mesmo? vamos esperar para ver se eles voltam.

abração

Luiz Calcagno disse...

Maitê é um nome bonito. Será que o som da pronúnicia não apazígua a situação? Se comprar um vídeo-game, que tenha um joguinho do star wars. Abraços

Germano Viana Xavier disse...

Eu tenho um legítimo Atari 2600 e um Mega Drive I (Americano). Os dois funcionam perfeitamente. O Atari é peça de museu e não troco por nada. E eles podem ajudar sim.

Sigamos...

Felipe Lima disse...

Briga séria, essa.

OBS: Caso opte pelo suicídio, tente não usar cordas. Se optar pelas cordas, amarre só na cabeça. A de cima, lógico. Sou um bom amigo, tá vendo?

PS: Perdoe-me Carradine, onde você estiver. Não consegui resistir à piada.

Beto Canales disse...

Hehehe... depois do gafanhoto eu percebi que ainda tenho muito a aprender....